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sexta-feira, 2 de outubro de 2009

Relacionamentos líquidos I


Pensando em relacionamentos e matérias líquidas, o curioso hoje em dia, é que com tanta informação, com as palavras e a razão transbordando por todos os meios e lados, ninguém ensine às crianças, ou melhor, aos jovens, adolescentes ou não, a verdadeiramente viver, a sentir, a amar, a apreciar, a contemplar... Nem mesmo a pensar. Entretanto, ensina-se tudo que não precisa, que já é natural em qualquer ser vivente. E de todos os instintos hoje tão propalados e ensinados, o top da lista é o sexo. De todas as formas: dos livros ao cinema, dos folhetins ao teatro, das revistas à Internet, nas escolas, nas Igrejas, nas ONGs, nas associações comunitárias... enfim, não há um só lugar hoje que não leve o cidadão jovem a pensar, a ver, a saber, a experimentar o sexo. E não só fala-se muito, com a desculpa de estar conscientizando dos riscos e conseqüências naturais de uma prática mais antiga que os dinossauros, como se estimula a sua prática constante, assídua, cedo, e também tarde agora, com o sexo da terceira idade, etc Parece que o indivíduo não sabe o desejo que tem e precisa de que um ‘esclarecido’ venha dizer que a causa de tudo que ele sofre é porque não faz mais sexo, ou de que nunca fez direito, ou de que faz pouco, o porque faz rápido, mecanicamente, sem graça e por aí vai.

Segundo os entendidos e especialistas, deve-se fazer sexo todos os dias: de noite, de tarde, de manhã, com o café, em casa, no motel, no trabalho, depois do trabalho, com o chefe, com a secretária, com a colega de repartição, com o colega do curso, com a faxineira, com o policial, com o marginal, com o computador, por telefone, via Internet, sozinho, com aparelhos, com o cachorro, com o vizinho, com homem, com a mulher, a três, a quatro, grupal, ufa!, a lista é quase infinita! Enfim, FAÇA SEXO! É o lema da sociedade capitalista de hoje, seja ela de primeiro, segundo, terceiro ou quarto mundo, mas também da comunista, de uma forma mais reservada, e nas fundamentalistas, de uma forma mais reservada ainda.

Com toda esta propaganda, com essa disseminação pior que o vírus da Aids, reclama-se da gravidez precoce, da pedofilia, da prostituição nas diversas idades e dos diversos gêneros, das perversões que não param de se multiplicar assim como as doenças venéreas, isto para não mencionar as mães solteiras, os conflitos, as revoltas e a violência crescente, além dos abandonos e das mortes por estrupo ou qualquer outra inconseqüência dessas.

Nos idos anos 60 e 70, com a ideologia ‘faça amor não faça a guerra’, pensou-se talvez que o problema do mundo fosse a repressão. Até mesmo um grande psicólogo social – Wilhelm Reich acreditou que a violência nas sociedades, tinha como causa a repressão social, o tabu em torno do sexo. Bem, se ele estivesse vivo hoje, acreditamos que ele reformulasse sua teoria, visto a sociedade mais liberal do planeta, a americana, apresenta o maior índice de violência e psicopatia mortal, além de se constituir como uma sociedade eminentemente bélica. E esta grande e rica sociedade tem sido o nosso modelo nacional em quase tudo, não apenas nisso, é lógico!

E este tão banal instinto é mais falado que qualquer paixão, que qualquer hobby, que qualquer descoberta científica ou dúvida filosófica. Se um jovem quiser dedicar-se ao estudo, à investigação científica ou filosófica, à arte musical ou outra, com o mesmo empenho com que se propaga a prática do ato sexual, surgirão especialistas e educadores, pais e professores para dizer que ele não pode, que não deve, que o indivíduo é obsessivo, que vai ficar maluco de tanto estudar ou perguntar, que está fugindo do mundo real (os aficionados em vídeo-games, PC games e outros congêneres, não, estes estão a salvo!) e virão psicólogos, terapeutas, padres, pastores, gurus para analisar o caso, definir e aconselhar que o ‘coitado’ (que aliás não é coitado no sentido pleno do termo)deve largar esta vida de estudos e paixões artísticas, e cair no vácuo da vida, da existência, dos relacionamentos casuais, interessados ou usuais, do culto ao corpo, em todos os sentidos – do possivelmente saudável ao mais doentio, ou seja, das academias de ginásticas às clínicas de cirurgias plástica – e outros conselhos mais. E quando ele fizer esta escolha e começar a praticar sexo como um maratonista ou como quem come um hambúrguer, ele será aceito socialmente, participará de grupos, gangues, tribos, facções, blogues e congêneres desta imensa aldeia global, onde todos vivem, ou melhor, sobrevivem a comer, a dormir e a ‘relacionar-se’ sexualmente, porque o resto? Bem, o resto - o saber, o sentir, o produzir, o pensar, o amar, o criar - é para poucos ou para os “sexoréxicos”.

Afinal, o projeto (não profecia) há algum tempo anunciado, não só para toda a Terra, mas para toda Humanidade nela existente foi, não só a sua fragmentação, denunciada no início do século XX por artistas e pensadores diversos, mas o seu esfacelamento, a sua extinção total através da exacerbação da alienação.

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