Postagem em destaque

 Como os pássaros, eu também migro. Estou migrando minha atividade artístico-literária e filosófica para o site: www.crisdanois.com Dê uma p...

quarta-feira, 27 de abril de 2016

QUEM TEM MEDO DA CORREÇÃO?



Começamos o milênio muito bem. Criamos um novo tabu: a correção. E da área pedagógica escolar, espalhou-se para a educação em geral. A psicologia aprovou o tabu e a política também. Os psicólogos inventaram o trauma pós-correção e os políticos criaram o Conselho Tutelar para apontar os pais que ainda teimam em corrigir seus filhos. E os filhos viraram os delatores assim como os alunos, apontando dedos aos mais sábios e aos mais velhos.  Não, isto não é uma paráfrase do “Admirável mundo novo” de Aldous Huxley, nem o trecho de alguma distopia. É a nossa realidade do século XXI. E como não se pode mais corrigir, julgar, avaliar, as crianças vão crescendo sem limites. E sem limites vão criando neuroses e síndromes jamais vistas antes. Tem muito déficit de atenção que é falta de curiosidade e de uma simples correção. Os médicos entram no rol dos beneficiados e os laboratórios idem. Hoje temos bilhões envolvidos nessa trama – é proibido proibir!
A desculpa para a aprovação automática e continuada varia desde a área da estatística à área da psico-pedagogia. Os políticos aprovam os números, pois com a aprovação automática não há mais evasão escolar (óbvio!). Como se o único motivo para a evasão escolar fosse a reprovação.  Se unirmos este fato ao da obrigatoriedade escolar a partir dos 6 anos até os 17, criamos uma sociedade ideal! Escolarizada e educada! Mas é isso que vemos na realidade? Acrescente-se a isto, o sistema de cotas das faculdades e realmente alcançamos a glória! Mas novamente a realidade nos mostra outros números, outra face!
Eu ainda era professora quando fui  informada que não reprovaríamos mais. E o que fazer com o aluno que passou direto pela disciplina sem alcançar os conteúdos mínimos? Porque não há medidas concretas para sanar este fato – melhor, não há porque não foi pensado nem previsto. Entretanto, no meu tempo de aluna, tínhamos a recuperação, a prova final e a 2ª época. O aluno tinha muita chance de se recuperar, pois o sistema previa aulas de recuperação – e olha que os pais reclamavam dizendo: se não aprendeu em um ano, não é em duas semanas que vai aprender. Porém nem todos estavam informados do processo – o professor selecionava o essencial da disciplina e dava nestas duas semanas intensivamente. Não tinha como não aprender.
  Um aluno pode não alcançar o saber, ou melhor, não construir o seu conhecimento por diversos motivos. Eu considero a inteligência (pois todos temos uma gama de matizes disso que chamamos inteligência) um dos últimos na lista que pode se estender desde problemas reais até escolha pessoal. Outra desculpa muito comum dada pelos políticos que engendraram a aprovação automática é a de que não é justo reprovar um aluno se ele ficou em apenas 01 matéria. Isso dificilmente acontece. Os conselhos de classe são formados por professores – seres humanos – e não robôs ou carrascos. Geralmente o aluno reprovado está mal em diversas disciplinas.
Particularmente na minha área, não passar em português/literatura afeta as demais áreas do conhecimento. Se um aluno não consegue os conteúdos mínimos da linguagem e da leitura em sua própria língua como aprová-lo e jogá-lo adiante? Sem uma boa leitura e interpretação os conteúdos de história, filosofia, geografia e até mesmo matemática (ou física, ou química) ficam prejudicados, pois dependem essencialmente desta capacidade. E como aprender uma língua estrangeira se não sabe bem a própria? Ele será sempre um aluno e profissional sofrível. Aí está a base do analfabetismo funcional que falamos em crônica anterior.
Não digo que a ideia seja má nas primeiras séries do fundamental. Entretanto, adotar a educação continuada sem reprovação em salas de aula divididas por séries é um enorme contrassenso. O correto seria estruturar o ensino fundamental de acordo com a teoria construtivista. Eu tive experiência neste tipo de escola e o resultado é mais que satisfatório e realmente funciona. O aluno constrói o seu conhecimento de acordo com a sua maturidade e vontade. As salas de aula são por disciplina e não por série. Cada aluno frequenta de acordo com a sua maior ou menos dificuldade. Creio que poderia se estender até o ensino médio.  Não haveria custo por parte do governo nem das escolas no sentido material, mas o custo seria dos professores que teriam que ser  treinados nesta forma de ensinar.
Nosso sistema de ensino é calcado no século anterior. Salas por séries estanques e conteúdos programáticos – deem o nome que derem: curricular, transversal, politécnico, obliquo – obrigatórios montados em gabinetes por burocratas da educação, impostos de cima para baixo. E somente a avaliação é uma prática contemporânea e atualizada? Na verdade, o processo de avaliação passa a ser uma peça de teatro, uma pantomima, uma encenação de mau gosto dentro deste contexto. Os atores? Os professores.
Todo sistema de ensino é político, todo saber pertence à classe dominante que rege ou que quer gerir as massas no futuro. A quem serve esse sistema educacional, é o que devemos nos perguntar. Se nos debruçarmos um pouquinho na janela da História, veremos que os sistemas totalitários – religiosos ou não – sempre lançaram mão da educação. Este não seria diferente. Basta ler os livros didáticos distribuídos pelo governo federal e as provas do ENEM

.
Se eu diplomo pessoas incapazes, eu fico com dois problemas:  1. Eu tenho maus profissionais, maus atendimentos, pontes mal construídas, doenças não curadas, injustiças e etc. 2. Eu posso colocar um mapa do tesouro, um livro dos segredos de como dominar o mundo na frente delas e elas não saberão o que fazer com eles, não saberão lê-los, não saberão decifrá-los e o meu controle será bem mais “barato”. Lembro-me quando um general da CIA, nos idos anos 80 comentou com um repórter sobre isso. “No futuro, gastaremos menos armamentos para controlar as massas. A guerra da informação está só começando e das mídias ela se espalhará pelas escolas e toda a sociedade. Não gastaremos nem um só dólar em armas, pois todos estarão dominados pela contrainformação e a não informação.”
Termino esta crônica que daria uma Tese de Doutorado com uma pergunta: na área dos esportes, das artes e do ensino técnico a aprovação é automática? Portanto, temos que nos perguntar a quem está interessando esta prática, seja escolar ou de vida, e tomar as rédeas da educação para mudarmos agora, pois este processo leva no mínimo 10 anos para começar a surtir efeito.

quarta-feira, 13 de abril de 2016

QUE LÍNGUA NÓS FALAMOS?



É comum o questionamento a respeito da nossa língua materna.  A maioria dos países colonizados na idade moderna tem a mesma questão. Foram os românticos que começaram com esse questionamento buscando uma expressão autóctone. Hoje, americanos, canadenses, latinos de língua espanhola e nós nos questionamos a respeito do nosso idioma. Alguns países da África e da Ásia também se voltam para esta pergunta fundamental que se relaciona com a identidade.
Se refletirmos que o ato de descobrir, conquistar, dominar e colonizar é tão velho quanto o mundo, mesma as chamadas línguas mãe da Europa ou do Oriente padecem com os mesmos questionamentos. O ato de dominar um país ou nação sempre foi acompanhado da afirmação e imposição do idioma do conquistador. Logo a língua é um objeto político de sujeição, afirmação, dominação como também de expressão, libertação, revelação. Dos romanos aos ingleses, dos árabes aos portugueses, dos persas aos espanhóis, todos impuseram sua língua e cultura no ato da conquista e da dominação. É o que chamam de colonização!
Um dos mitos mais antigos que se tem conhecimento que aborda essa questão é o mito da torre de Babel presenta na mitologia judaica e babilônica. Nele afirma-se que todos falavam uma só língua e que pela ousadia do homem de querer chegar aos céus para conhecer os deuses, foram punidos com o plurilinguismo e a tal torre enfim, não pode ser construída, já que cada trabalhador passou a falar uma língua. Os Astecas sustentam a história de que apenas um homem, Coxcox e uma mulher, Xochiquetzal, sobreviveram à inundação, tendo flutuado em um pedaço de casca de árvore. Eles encontraram terra e geraram muitas crianças que nasceram incapazes de falar, mas, posteriormente, com a chegada de uma pomba foram dotados de linguagem, embora a cada um tenha sido um modo de expressão vocal diferente. Assim, eles não podiam se entender uns com os outros.
Em toda região do globo há um mito explicativo a respeito da diversidade linguística.  Aí está todo o objeto da linguística histórica – afinal, tivemos mesmo um único idioma em tempos imemoriais?
Podemos afirmar que há duas correntes que se antagonizam no que tange às soluções. A corrente da unidade e a corrente da diversidade. A primeira visa unir todas as diferenças e escolher um ponto comum – standart – para que haja uma comunicação clara, uniforme e fluida entre os falantes em qualquer ponto da nação. É a corrente que defende a importância da gramaticalidade, da norma culta, do léxico apurado e da pronúncia correta. A segunda prima pela diversidade sem se preocupar com um horizonte de comunicação única. Valoriza as formas de expressão diferenciadas, os sotaques, os dialetos a fim de manter a variedade e os elementos históricos do(s) idioma(s). Visa também a manutenção do entendimento de documentos ou monumentos antigos para uma melhor reconstrução do passado de uma coletividade.
As duas correntes têm suas razões e seus argumentos bem fundamentados. Mas isso não justifica o que vemos acontecer hoje em dia nas salas de aula com o nosso idioma (que muitos oscilam em defini-lo como língua portuguesa ou língua brasileira). Toda língua tem seu uso formal e informal de acordo com a situação, ambiente e propósito. Em todas encontramos jargões, gírias, expressões específicas e falares de acordo com a classe social. A internet não é a origem desse fenômeno, apenas evidenciou e generalizou o fato. Mensagens rápidas economizam espaço e tempo; é comum que se abrevie e se economize na “fala”.  Porém, falar errado não tem nada a ver com o escrever no messenger, facebook ou whatsap numa forma contrata e descontraída.
Entretanto, esse fato – o abreviar as palavras, o escrever como se fala, as gírias – nunca impediu de se respeitar, conhecer e cultivar a norma culta para melhor transitar nas situações em que ela é essencial – fórum, faculdade, mercado de trabalho, etc. Para isso o ensino da língua materna é fundamental em qualquer parte do mundo. A escola é um espaço democrático que recebe todas as formas de expressão, mas visa transformar essa forma, burilar e aperfeiçoa para crescimento do indivíduo cidadão, visando seu crescimento pessoal e social.
A crise e a confusão gerada parte dos burocratas da educação e da política populista em voga atualmente em diversos países, não só no Brasil, mais confundem e bagunçam o sistema educacional e os currículos do que auxiliam com suas reformas massificantes, generalizantes e niveladoras por baixo. O populismo, infelizmente, está espalhado em diversos países do terceiro mundo e infestando o primeiro mundo também com sua ideologia de massa. Mas isso é intencional no sentido do controle e dominação de todos e não no sentido contrário como afirma a ideologia populista. Inclusão não é isso. Inclusão é acolher todo e qualquer indivíduo com sua cultura e expressão, mas dar a esse indivíduo os meios reais para participar da sociedade como um igual e conquistar um lugar no mercado de trabalho junto com os demais. O sistema de cotas é um elitismo disfarçado de inclusão.



E os professores? Alguns mal formados ou informados vão repetindo sem questionar esse procedimento que desintegra o idioma e a sociedade, pois uma nação é definida pela unidade de seu idioma. Há os inseguros, os desinteressados e os desesperados e todos nada fazem para mudar o atual estado do ensino da língua materna. Temem corrigir na fala e na escrita o próprio idioma, salvo quando se aprende uma língua estrangeira. Este fato dá o que pensar: por que eu corrijo um aluno que está aprendendo inglês, na pronúncia e na escrita e não o corrijo no seu próprio idioma?
 E os alunos são apoiados a afirmar sua inocente ignorância pelas falsas mídias que preferem uma juventude inerte e obsoleta que não consiga ler o próprio passado nem refletir o seu presente que uma juventude pensante, conhecedora e atuante que consiga construir um futuro melhor.