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quinta-feira, 24 de março de 2016

Leitura e analfabetismo funcional



O analfabetismo ainda é uma preocupação no Brasil. Cerca de quase 10% da população nacional é analfabeta. Mas, outro dado é ainda mais preocupante no país. É o índice de analfabetos funcionais que chega ao alarmante número de 54% segundo as últimas pesquisas do IBGE.
O analfabetismo funcional possui pelo menos 2 graus e não inclui o escrever errado – seja quanto à ortografia ou à gramática. É caracterizado por aquele que não consegue decodificar as palavras que lê. Lê, mas o que lê não faz sentido. Não consegue ler um manual de instruções, seguir ordens planejadas passo a passo e não consegue expressar-se por escrito de nenhuma maneira. O segundo grau é a inadequação da leitura e da escrita, caracterizando por uma infantilização – o indivíduo não consegue acompanhar os textos que seriam próprios da sua idade (maturidade) bem como sua expressão é bastante inadequada à idade.
Vamos a um exemplo: um aluno de 5º ano lê bem livros do 3º e 2º ano, mas não os apropriados à sua idade. O de 9º ano está lendo os livros para 6º ano e assim por diante.  Este é o quadro nacional mais comum, salvo raríssimas exceções. Pensando(metaforicamente) em Machado de Assis: os livros Iaiá Garcia e a Mão e a Luva seriam apropriados aos alunos de 5º ano, Helena e Ressurreição aos alunos de 7º ano, a famosa trilogia de Memórias Póstumas, Quincas Borba e Dom Casmurro seriam facilmente compreendidos pelos alunos de 9º ano junto com o conto o Alienista e assim por diante.


Da mesma forma podemos relacionar os outros romances de literatura brasileira. A rigor, as obras românticas e do início do realismo são bem compreendidas pelos alunos do fundamental. As obras maduras e de vanguarda pelos alunos do ensino médio. As obras contemporâneas são apropriadas aos alunos de nível superior ou se preparando para isso. A contextualização é responsabilidade dos professores da áreas de linguagens.
Outro exemplo: a obra inglesa Harry Potter foi escrita para crianças de 8 a10 anos, ou seja, alunos de 3º a 4º anos e o Mundo de Sofia do norueguês Jostein Gaardner para alunos de 7º a 9º anos. Entretanto, no Brasil vemos que são os alunos de 8º e 9º anos que curtem o menino bruxo e o romance filosófico restringe-se ao curso superior, quando é lido.  É comum alunos e professores dizerem que as obras são difíceis, que tem vocabulário difícil entre outras desculpas esquecendo o papel da escola. A escola não foi criada para manter o aluno no seu nível de conhecimento. A escola acolhe o saber do aluno e o amplia, diversifica, apresentando mais possibilidades. No tocante a língua materna, quanto mais o aluno aprofunda e amplia seu vocabulário e forma de expressão, mais ele fica apto a se expressar no mundo, seja particular ou social, em língua falada ou escrita.
O fenômeno que vemos de empobrecimento da linguagem não é um fenômeno causado pelas mídias e sim pela omissão escolar. A questão não está em escrever abreviado porque isso, as taquígrafas do século XIX e XX faziam sem perder a qualidade linguística. O problema é que o vocabulário passivo hoje em dia da maioria dos jovens vem sendo reduzido drasticamente. Se considerarmos que o vocabulário ativo de um falante é relativamente menor que o passivo, mas que este permite a leitura e compreensão da maior parte das obras já escritas, a redução deste causa o fenômeno  que vemos da rejeição à leitura “porque é difícil”, “porque não sei que palavras são aquelas”, “ não entendo nada”, etc.
Há um grupo de professores e pedagogos que defendem essa situação apelando para as tecnologias e modernidades. Comparam o vocabulário de pessoas idosas com os jovens e apontam que eles conhecem palavras que são desconhecidas dos mais velhos, que sabem mais coisas, que são mais atuantes  geralmente no tocante à tecnologia.  Mas isto é uma falácia, pois este vocabulário é como um jargão específico que quando conhecido e entendido é logo absorvido e que atuação há numa plataforma como o facebook?
O número de alfabetizados que lê razoavelmente, mas escreve mal e errado gira em torno de 30% segundo as pesquisas que tem por base os exames do Enem, vestibulares e outros concursos públicos. Ou seja, restam-nos 10% corretamente alfabetizados e com bom desempenho profissional e social.
Esses dados nos permite concluir, ainda que parcialmente, que ter acesso à escola e à educação formal não garante uma boa alfabetização. E, exatamente por isso, é mais difícil de ser erradicado, pois os responsáveis se espalham entre alunos, professores, pedagogos, secretários e especialistas em educação.
Os alunos são mantidos e aprovados mediante frequência e comportamento e não em função do real aprendizado dentro desta educação burocratizada que temos hoje no país, a serviço de uma ideologia específica que luta contra uma “elite branca burguesa” e sua “meritocracia”. Isso além de desmotivar o aluno, ensina que não é preciso esforço para se alcançar nada e que querer ser melhor não é interessante nem louvável.
 Entretanto, cabe notar que a elaboração de um currículo de leitura e de ensino de língua nativa é totalmente objetivo, não cabendo subjetividades e outras idiossincrasias. Portanto, fácil de ser elaborado e seguido caso houvesse vontade política para tal.
O sistema se enrola num novelo vicioso que começa nos professores e seus salários irrisórios e termina nos ideólogos de plantão em defesa de uma aprovação e aceitação automática de tudo em nome da chamada “inclusão social”. A adoção e instalação de aparatos pedagógicos de tecnologia avançada não garantem a erradicação do analfabetismo funcional, nem mesmo as facilidades do ensino à distância. Ao contrário, endossam o quadro que se encontra a educação brasileira, pois quem não lê livros também não lê em PC ou Tablet ou outro leitor porque o vocabulário é o mesmo, independente do meio.
A facilitação na concessão de diplomas conclusivos em qualquer instância, com redução de carga horária e de nível de cobrança dos TCCs comprometem a inclusão no mercado de trabalho, seja nacional ou internacional, além de restringir o desenvolvimento pessoal e profissional do cidadão.
Vivemos um momento de apagão de talentos, de falta de mão-de-obra especializada, mesmo em nível básico como o politécnico do ensino médio. Há uma grande ineficiência de produção consequente do nivelamento por baixo – um processo negativo da massificação. E o ônus disso cai sobre os professores de língua portuguesa.
Os professores de língua portuguesa  ficam com o maior peso desse ônus. Sem um programa claro e objetivo de leitura, sem um trabalho efetivo dentro de sala de aula com o texto, seja de que natureza for,  é impossível conseguir um avanço real do aluno. O comprometimento da leitura em língua portuguesa afeta todas as outras disciplinas – desde a área de humanas às ciências da natureza ou matemáticas, pois tudo inclui a leitura e a interpretação bem como o raciocínio lógico que só ocorre linguisticamente. Até mesmo o ensino de uma língua estrangeira não avança pois sem o conhecimento da própria língua, impossível crescer em outra língua.



quinta-feira, 10 de março de 2016

DESPENCANDO O NÍVEL



Quando pensávamos que nada mais poderia ser pior na educação brasileira, eis que surge o novo projeto deste governo – a proposta da Base Nacional Comum Curricular (BNC). A especialista em política educacional Paula Louzano diz que a proposta feita pelo governo não estabelece objetivos claros para o aprendizado e vai formar alunos menos preparados que antes e menos preparados que os de outros países.
Um currículo como este leva tempo para ser elaborado e em países de 1º mundo como Austrália, Finlândia, EUA, Canadá entre outros desenvolveram para língua nativa/materna e matemática e levaram no mínimo 2 anos em discussões. O Brasil sai na frente fazendo para todas as matérias, em tempo recorde – meses!  Ora, só pode resultar no que está lá em Brasília. Num emaranhado que nem leigos nem especialistas conseguem decifrar.
Só para citar um exemplo: nossos alunos de 9º vão estar (e muitos já estão porque esse programa não inova muito a partir do que já está em vigor) no nível de um aluno americano de 5º ano. Um aluno americano sai da primeira fase do fundamental com leitura fluida de clássicos da literatura inglesa e americana originais, sem adaptações.  O nosso, em geral,  mal sabe ler. Em média, os programas de leitura de outros países que pude analisar, propõem de 12 a 14 livros por ano. Isso sem contar as leituras ocasionais ou por puro prazer. Isso requer 01 livro a cada 15 dias. E é possível? Sim. Seguindo a orientação/adequação vocabular e temática a maioria dos alunos vencem com facilidade a proposta. No Canadá, EUA, Finlândia, França, Austrália entre outros os alunos em fundamental estudam 8 horas por dia além das horas extras em casa. O nosso aluno mal cumpre 4 horas na escola! Nas férias há sugestões de leituras que abarcam diversos temas transversais e disciplinas. É sabido pelos estudos de neurociência que o corpo tem que descansar, mas o cérebro tem que se manter em atividade. Cérebro relaxado demais, dispersa e não produz!
Para que o aprendizado realmente ocorra, os objetivos têm que estar claros para professores, diretores, alunos e pais. Todo ensino é um processo. As informações viram conhecimento à medida que se aprofundam os conceitos – do concreto para o abstrato. Vejamos um exemplo em matemática: o conceito de frações começa mostrando que o inteiro pode ser dividido em partes. Depois vem a representação disso em forma de fração. Em seguida, deduzem-se as porcentagens até chegar a cálculos de juros. Se todas as etapas são cumpridas, o aluno, ao ingressar o ensino médio, terá a capacidade de aprender estatística básica, resolver problemas que envolvam juros simples, compostos e etc.
O mais interessante, é que o Brasil elaborou o seu programa sem olhar para nenhuma experiência similar – nem de 1º e nem de 3º mundo. É comum países copiarem suas experiências positivas. Numa era de globalização e informação partilhada mundialmente, não copiar o melhor é, no mínimo, burrice (ou orgulho).
Quanto ao sistema de avaliação, nossas escolas foram obrigadas a adotar um sistema ideológico que é contra o sucesso que eles chamam de meritocracia. Segundo esse sistema aquele que se dedica e constrói seu saber não deve se sobressair, não deve aparecer como tal. (Será que eles propõem o contrário?)  Em nenhum sistema educacional que pesquisei a nota vale tão pouco. Nós temos 3 letras – S, P, I. Acontece que esse S, que diz satisfatório, inclui no mesmo saco alunos 10 e alunos 6! Um aluno que tirou 10 completou todas as etapas e adquiriu todo conhecimento proposto. O aluno 6 fez isso parcialmente e não satisfatoriamente. Eu pergunto: quem está satisfeito? O professor,  o aluno, os pais? O P que vai de 5,9 a 3,0, pretende defender que um aluno que tirou 3,0 em qualquer disciplina alcançou um conhecimento parcial! O I, sem comentários. Ora, isso é uma enganação que não permite a ascensão real dos alunos – nem para continuidade de estudos nem na vida e ainda desestimula. Concursos públicos são avaliados em pontos em não em letras e o que manda é a meritocracia. Mas, qual o problema com o mérito? Estão conotando essa palavra erradamente. Mérito é merecimento, valor, aptidão. Se o aluno estuda, se dedica e pesquisa mais que natural que tenha notas altas e que galgue lugares melhores na sociedade.
O mais insano é que depois desse ensino/aprendizagem vão defender cotas por raças e minorias porque os alunos não conseguem competir com a chamada burguesia branca. Quanta hipocrisia vindo  das minorias coloridas e ditas incapazes! É como deixar a criança desnutrida de propósito e acusar o sistema de saúde e a sociedade dela não ter condições de competir, de trabalhar, de viver e reivindicar uma bolsa nutrição!
Enquanto professora atuante eu sempre desafiei meus alunos a estudarem para conseguir as melhores vagas nas faculdades estaduais ou federais. A turma que se dedicava, passava. Para mim ficou mais que provado que é uma questão de conteúdo, informação, exercícios e dedicação, é claro. Havia um grupo de amostragem, os que não se engajavam na proposta e a diferença era gritante! O que adianta dar uma cota para um aluno mal preparado? O vestibular de qualquer universidade federal é e sempre será democrático. Corrigi muita prova de vestibular UFRJ/UERJ e em nenhuma delas havia retrato do aluno, nem mesmo nome. Apenas corrigíamos conteúdo, expressão, organização do pensamento. Portanto, é totalmente imparcial.
Se não devemos premiar o bom, o melhor, devíamos dar o exemplo começando por acabar com as Copas do Mundo, as Olimpíadas, os Concursos de Beleza, as medalhas nos esportes em geral. Realmente, o populismo é a pior forma de governo existente, a mais hipócrita, a mais manipuladora, a mais mentirosa que uma sociedade já produziu.
O que esse governo propõem é uma indigência, uma insensatez, uma enganação cultuando o hábito de burlar e dar um jeitinho, passando por cima do conceito da verdadeira democracia. A questão não é distribuir cotas, mas dar as condições de concorrer. A questão não é dar esmola em bolsas, mas melhorar a qualidade do empregado e de suas chances de ascensão social pelo trabalho, pelo mérito!